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14.7.12

Dona Genoveva, seus cisnes e suas borboletas

Em 1894, o Sr. Joaquim Augusto Ponces de Carvalho, primeiro e único Conde de Vilar Seco, manda construir um palácio para residência lisboeta, pois o andar que possuia na Rua de Santo Antão não lhe chegava. O Sr. Conde, que já tinha um magnífico palácio na Beira Alta, estava bem casado com D. Ana Maria Juliana de Morais Sarmento, filha do primeiro Visconde da Torre de Moncorvo e já viúva do quarto Conde da Anadia, o Sr. José Maria de Sá Pereira Meneses Pais do Amaral de Almeida e Vasconcelos Quifel Barberino (com direito a uma linha extra para o nome no Bilhete de Identidade).


Como o Sr. Conde e esposa morreram sem descendência, terminou ali a linhagem dos Condes de Vilar Seco e o palácio passou para as mãos dos Condes de Anadia. Em 1913, o edifício pertencia à Condessa de Alferrarede, viúva do quinto Conde de Anadia.

O pequeno vestíbulo, de onde não apetece sair.

Tendo ficado devoluto, o palácio é arrendado em 1920 pelo Dr. Rui Ennes Ulrich e sua esposa D. Genoveva de Lima Mayer.
Genoveva era filha de Carlos de Lima Mayer (irmão do Adolfo, "o tal" do Parque Mayer), um dos intelectuais que formaram no final do século XIX o grupo dos "Vencidos da Vida" e grande amigo de Eça de Queirós.
Após o seu casamento em 1907 com o banqueiro Rui Ulrich e tendo adoptado o nome artístico de Veva de Lima, Mme. Ulrich começou a frequentar a vida intelectual lisboeta e causou escândalo: tinha uma chita que passeava pela trela nas suas casas de Lisboa e do Estoril, fumava de boquilha comprida, ia de carro com chauffeur até ao Chiado e vestia-se com uma elegância invulgar entre as portuguesas.





Veva adorava encenações, quanto mais exóticas melhor. Conta-se que um dia aproveitou a presença de um circo em Lisboa e alugou os camelos, como adereços para mais uma festa de arromba que ia dar nos seus jardins.




Em 1932, Rui Ulrich foi nomeado Embaixador de Portugal em Londres, e D.Veva aproveitou o ensejo para dar largas à sua criatividade na decoração da Embaixada. As aquisições exorbitantes que efectuou não estavam cobertas pela dotação orçamental da Embaixada (um pequeno lapso que causou a exoneração do Embaixador), pelo que acabaram por ser pagas pelo casal Ulrich e trazidas para decoração do seu palácio em Lisboa.


Veva de Lima lidou mal com o envelhecimento, agravado pelas recordações de dois suicídios (seu pai Carlos em 1910 e seu filho Jorge em 1932). Atormentada por depressões, teimava em manter a maquilhagem carregada dos anos 30, mentindo na idade e criando obsessivas quimeras de imortalidade e reincarnação. Rodeada pelos incontáveis cisnes e borboletas, paradigmas do renascimento onde se revia e se simbolizava, Genoveva de Lima Mayer Ulrich faleceu em 1963, com 77 anos. Rui Ennes Ulrich faleceu 3 anos mais tarde, com 83 anos.

Em 1980, o edifício é adquirido pela Câmara Municipal de Lisboa a Miguel Pais do Amaral, proprietário do fronteiro Palácio dos Condes da Anadia. De seguida, foi constituida a Associação Casa Veva de Lima, a qual, por insistência da filha Maria Ulrich, mantém o espólio inalterado. Quem passa pelo discreto edifício na zona das Amoreiras não imagina que as tertúlias que lhe deram fama se repetem todos as quinzenas, ainda hoje. Os membros da associação e seus convidados vão vestidos a rigor, como se fossem "jantar com a Veva". Depois das refeições realizam-se palestras e concertos. Intelectuais, artistas e diplomatas são presença frequente. E até o Rei Umberto II de Itália aí compareceu uma vez.


Aceitando o amável convite da Veva, vamos então subir...





Galeria do 1º andar.





Área privada do palácio.

Veva de Lima em Londres, fotografada por Sir Cecil Beaton.
O hiper-exótico quarto de dormir.







As áreas públicas






A sala das tertúlias, preparada para a próxima.

A sala de jantar, com um marcado "Efeito Ah!"



11 comments:

Anonymous said...

Um prazer.
Obrigado pela viagem.

Anonymous said...

E vivo eu nsta cidade de que conheço tão pouco!
OBRIGADO!

TrekMan said...

Excelente recolha fotográfica!
Gostaria de salientar três (penso que há mais) peças em ferro forjado, produzidas pelo Mestre Lourenço Chaves de Almeida, o "Ourives do ferro, ferreiro de jóias", como lhe chamou Afonso Lopes Vieira: o trípode de perfumador, e o Lectus Romano, ambos no estilo pompeiano, e uma escultura com lanterna (candeeiro) que era parte de um grupo de quatro estatuetas feitas a partir de um eixo de carro de bois.
Muito do trabalho deste artista, autor do Lampadário (Chama da Pátria) que se encontra no Mosteiro da Batalha, é desconhecido da maioria dos portugueses... infelizmente!

Mário Marzagão said...

Caro TrekMan, obrigado pela referência a Mestre Lourenço Chaves de Almeida, que eu desconhecia. Aqui fica a sua útil informação.

Suzana Toscano said...

Fantástico este "segredo" tão bem guardado da nossa cidade. Obrigada!

m.j.serra said...

Meu Deus ,não fazia ideia de que esta senhora era tia da D.Manuela De Lima Mayer Antunes,uma senhora com quase 85 anos de idade de quem eu gosto muito.Não há dúvida é vivendo e aprendendo.

Maria José Rebelo said...

Gostei imenso destas imagens! As fotos são de excelente qualidade e a decoração absolutamente deslumbrante. Também gostava de a visitar. É visitável?

Mário Marzagão said...

Cara Maria José, é fácil encontrar o contacto da Casa Veva de Lima na Net. Para além das tertúlias literárias que realizam com frequência, poderá integrar-se numa das várias visitas promovidas por diversas entidades.

R Costa said...

Gostei da visita. Olhando para a mãe e para o ambiente onde cresceu compreendo o exotismo de Maria Ulrich quando visitava a Escola. É um belo palacete com uma decoração muito peculiar e talvez seja a mais diversificada que já observei nas minhas andanças pelas casas e palácios desta Lisboa maravilhosa.
Obrigada pela oportunidade de conhecer mais um cantinho desconhecido.

Arlindo Almeida (Arlindogarden) said...

Verdadeira aristocrata de tempos relativamente recentes. Interessante.

Madalena said...

Tive a oportunidade de visitar este Palácio,com uma decoração que nos diz muito sobre a sua proprietária.A C.M.L faz visitas guiadas com alguma regularidade,visto o Palácio se encontrar com alguma degradação.Não compreendo porque não se faz uma intervenção na recuperação do edificio/interiores,pois podia ser uma fonte de receita turistca ,muito desconhecida da maioria dos habitantes de Lisboa.Passa despercebida aos passantes da zona das Amoreiras e o seu interior deixa-nos entre o belo e o fantasioso.
Excepcional reportagem,parabéns pelo trabalho fotográfico e histórico ,pois conta-nos o que era uma época da aristocracia versus a realidade do que na época era a cidade

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